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Wednesday, September 09, 2009

Esta noite estou feia. Perdi toda a fé na minha capacidade de atração. E no animal fêmea esta é uma moléstia bem patética.


1. Se eu não pensasse seria muito mais feliz; se não tivesse órgãos sexuais não vacilaria à beira de um ataque de nervos e lágrimas o tempo todo.


2. Há tanta dor neste jogo de procurar um parceiro, de testar, tentar. E a gente se dá conta subitamente de ter esquecido que era só um jogo, e vai embora chorando.


3. Sim, fiquei enlevada com você, ainda estou. Ninguém jamais despertou tamanha intensidade de sensação física em mim. Afastei-a, pois não suportaria ser um capricho passageiro. Antes de entregar meu corpo, preciso entregar meus pensamentos, minha mente, meus sonhos. E você não queria saber de nada disso.



4. Quero tomar consciência de tudo que considerava favas contadas. Quando a gente sente que “aquilo” pode ser um adeus, a pancada é mais intensa. Preciso ter algo. Quero parar tudo, a monumental farsa grotesca inteira, antes que seja tarde demais. Mas escrever não parece facilitar muito as coisas. Os grandes homens são todos surdos. Quando se pega a mãe, símbolo infantil de segurança e correção, chorando desolada na cozinha, quando se olha para o irmão mais novo, alto, de olhos sonhadores, e pensa que todo seu potencial será podado quando ele chegar aos 20 anos, antes mesmo que ele tenha uma chance, isso bate fundo na gente.

Agora sei o que é solidão, acho. Momentânea solidão, pelo menos. Vem do fundo vago do ser, como uma doença no sangue espalhada pelo corpo, de modo que não se pode localizar a origem, o ponto de contágio.
Estou de volta ao meu quarto. Saudade é o nome dado ao sentimento aflitivo que me domina agora. Sozinha no quarto, entre dois mundos. Lá embaixo se encontra alguns transeuntes, ninguém que eu realmente conheça. Poderia descer com meia dúzia de um texto previamente decorado, tentar fazer alguns amigos. Mas não, ainda não. Nada de escapar de mim mergulhando em conversas artificiais. Melhor ficar aqui e penetrar mais fundo nesta solidão.
Eis-me aqui, portanto, em meu quarto. Não dá para me enganar e escapar a constatação brutal de que não importa quanto você se considera entusiasmada, não importa a certeza de que caráter é destino, nada é real, passado ou futuro, quando a gente fica sozinha no quarto com o relógio tiquetaqueando alto no falso brilho ilusório da luz elétrica. E se você não tem passado ou futuro, que no final das contas são os elementos que formam o presente todo, então é bem capaz de descartar a casca vazia do presente e cometer suicídio. Mas a massa fria entranhada no meu crânio raciocina e papagaia; “Penso, logo existo”, sussurrando que sempre chega o momento da virada, da ascensão, do galgar de um novo degrau. Por isso, aguardo. Para que serve a boa aparência? Garantir segurança temporária? De que adianta o cérebro? Para dizer apenas eu vi e compreendi? Ah, claro, eu me odeio pela incapacidade de descer até a rua e buscar consolo na companhia de estranhos. Eu me odeio por ter que ficar aqui sentada e ser castigada por não sei o que dentro de mim. Aqui estou um monte de recordações do passado e sonhos futuros reunidos num monte de carne razoavelmente atraente. Lembro-me do que esta carne já passou; sonho com o que passará. Registro aqui a ação dos nervos ópticos, da percepção sensorial. E penso: Sou apenas uma gota a mais no imenso mar de matéria definida, com a capacidade de perceber minha existência. Entre os milhões, ao nascer eu também era tudo, potencialmente. Eu também fui cerceada, bloqueada, deformada por meu ambiente, pela manifestação da hereditariedade. Eu também arranjarei um conjunto de crenças, de padrões pelos quais viverei, e, no entanto a própria satisfação de encontrá-los será manchada pelo fato de que terei atingido o ápice em matéria de vida superficial. Esta solidão diminuirá e desvanecerá, sem dúvida, quando amanhã eu mergulhar novamente nos cursos, na necessidade de estudar. Mas agora este falso objetivo foi suspenso e giro num vácuo temporário. Não há outro ser vivo na terra neste momento além de mim.
Meu deus, a vida é solidão, apesar de todos os opiáceos, apesar do falso brilho das festas alegres sem propósito algum, apesar dos falsos semblantes sorridentes que todos ostentamos. E quando você finalmente encontra uma pessoa com quem sente poder abrir a alma, para chocada com as palavras pronunciadas – são tão ásperas, tão feias, tão desprovidas de significado e tão débeis, por terem ficado presas no pequeno quarto escuro dentro da gente por tanto tempo. Sim, há alegria, realização e companheirismo, mas a solidão da alma, em sua autoconsciência medonha, é horrível e predominante.

Saturday, September 05, 2009

I want to burn, even if I break myself. I live only for ecstasy. Nothing else effects me. Small doses, moderate loves- all these leave me cold. I like extravagance, heat... sexuality which bursts the thermometer! I am neurotic, perverted, destructive, fiery, dangerous- lava, inflammable, unrestrained. I feel like a jungle animal who is escaping captivity." - Anais Nin

Saturday, July 11, 2009




C. Do you remember “the shit” that happened to you as a child that makes you not want to trust people as an adult?
G.As long as I am concerned memories evanesce when we grow up. I have this blurry memory of my childhood

G. I think that both of us we sort of developed a different way to deal with our social-fucking life.
C. Yeah, I live by the code “I don´t do relationships”, but you….
G. I live by the code, “I idealize relationships”.
C. Why are you still looking for these stripper clubs?
G. Because when I am in there it’s my fucking choice. When I take off my top and I want to show my breasts, it’s my fucking choice. when I take off my pants and I show my pussy and then I stop when I want to stop and it makes me feel good because I am in charge. And it helps me remember all this childhood shit that happened to me. You know? And I have to.
C. You´re facing your demons head on and it´s something I have never done.
G. No, you just make it some other way.
C. You´re not alone, You have a family.
G. You are my family.
C. I admire you so much…, look at you…., look at your life. When you first came here you were just a “middle west girl” who knew nothing and now you are the great scriptwriter…, you changed your life through your writing…, your stories…, I just…. I just... I never found someone like you…, you´re my best friend…., I was always the one to give you support…and now…, that I feel that I ...., I just don´t know what to do. I feel lost.
G. I just have to face my demons by my own.

Sunday, June 21, 2009


J- You have seen the worst of me.
S- Yes.
J- And I nothing of you.
S- No.
S- But I like you.
S- I like you.
J- You´re my lost hope.
S- You don´t need a friend. You need a doctor.
S- You are so wrong.
S- But you have friends. You have a lot of friends. What do you offer your friends to make them so supportive? We have a professional relationship. I think we have a good relationship. But it’s professional. I feel your pain. But I can´t hold your life in my hands. You´ll be alright, You´re strong, I know you will be okay because I like you and you can´t like someone who doesn´t like themselves. The people I fear for are the ones I don´t like. Because they hate themselves so much they won´t let anyone else like them either. But I do like you. I will miss you. And I know you will be okay.


Saturday, June 13, 2009

A verdade nem sempre dói, não é mesmo?


Clara. Pronto, eis o nome dela. E o que posso dizer? Posso dizer que ela me procurou às nove da noite no sábado, que eu ainda sentia fraqueza após a extração dos dentes do siso naquela manhã. Posso dizer que saímos em dois casais para dançar no “Shebar”, que tomei cinco copos até o final da noite, de vodka pura, enquanto as outras bebiam cerveja. Mas não foi isso, nada disso. Foi assim que aconteceu. Vesti-me lentamente, alisando a roupa, passando perfume, cosméticos. Sei que me aprontei para uma noite de prazer sexual, tudo pensado nos mínimos detalhes. Eu não sairia com Clara de qualquer jeito, desejava aquela garota há dois anos. Existia todo um ritual, toda uma cerimônia composta de roupas, perfumes, massagens. Preparei-me um dia antes. Cabelo, unhas, esmalte preto, sei que ela gostava. Eu queria seduzi-la a qualquer custo.
Entramos no bar e nos sentamos. Sabia que seria eu a ter que superar o constrangimento inicial. Começamos a conversar.... sobre o enterro ao qual ela foi pela manhã, sobre o primo de vinte anos que quebrou a espinha e está paralítico pelo resto da vida, sobre a irmã que morreu de aids. “Meu deus, estamos mórbidos esta noite”, ela disse. Aí falamos de amenidades, como as palavras perdiam o sentido quando as repetíamos sem parar, como todos os garotos da faculdade pareciam iguais até a gente conhecê-los pessoalmente, e que detestávamos a idade que tínhamos.
Sempre me apavorei com aniversários, falei secamente. Não entendo, falei, como as pessoas conseguem ficar velhas. Secam por dentro. Quando somos jovens temos autoconfiança. Nem precisamos da religião.
“Por acaso você é católica”? Clara perguntou, como se isso fosse muito improvável.
“Não, e você?”
“Eu sou ela disse baixinho”
Conversamos mais, rimos mais, trocamos olhares oblíquos, seguimos com o roçar físico silencioso que torna tão deliciosa cada nova conquista. Pairava no ar o cheiro forte de feminilidade que criava o ambiente ideal para a minha existência. Havia algo em Clara naquela noite, um toque de seriedade, um magnetismo químico, que se encaixava em meu estado de espírito do jeito que duas peças se encaixam num quebra-cabeça infantil.
Na pista de dança ela me puxou para mais perto, meus seios firmes apertados contra os seus.

Foi como se um vinho quente fluísse através de mim, uma embriaguez elétrica. Ela encostou o rosto em meu cabelo, beijou minha face. “Não olhe para mim”, disse. Seu corpo quente firme contra o meu, conforme a música suave, erótica.
A dança é o prelúdio normal para uma noite de sexo, pensei. Tantas aulas de dança, quando somos pequenas demais para entender, e agora isso.
Clara olhou para mim, “acho melhor a gente sentar”. Fiz que não com a cabeça. “Não quer”? Ela disse. “E uma água, que tal”? Sentei-me e bebi a água que ela trouxe para mim, enquanto ela, de pé, olhava para baixo, era estranha sua fisionomia à meia-luz. Pus o copo de lado. “Foi rápido”, disse. “Deveria ter demorado mais”? Levantei-me e seu rosto se aproximou, os braços me envolveram. Passado um tempo, empurrei-a. “A chuva é tão gostosa. Faz a gente se sentir bem por dentro, básica, basta ouvir”. Eu estava encostada no balcão do bar. Clara, próxima, quente, olhos a brilhar, boca sensual e adorável. “Você”, falei deliberadamente, “não liga a mínima para mim, exceto fisicamente”. Qualquer uma negaria tal coisa, qualquer moça mentirosa. Mas Clara me sacudiu e havia urgência sem sua voz: “Sabe, você não devia ter dito isso, entendeu? Entendeu? “A verdade sempre dói।”

Idiota, falei, ou melhor, pensei alto.

“Não fique brava, ela riu. Afaste-se do balcão e veja”.
Recuando um passo, ela me puxou para perto de si, senti o estômago achatar e ela me beijou demorada e docemente, demorou a me soltar. "Pronto”, disse com um sorriso meigo, “ a verdade nem sempre dói, não é mesmo”?

Wednesday, June 03, 2009

Preciso falar uma coisa bem baixinho: gosto de você, mas não muito. Não quero gostar muito de ninguém.

Bem, jamais voltarei a vê-la, o que talvez seja melhor. Ela saiu da minha vida na noite passada, de uma vez por todas. Sei, com certeza repulsiva, que é o fim. Saímos juntas apenas duas vezes. Mesmo assim, gostei muito dela, gostei até demais. Tive que arrancá-la do meu coração para evitar que me magoasse ainda mais. Ah, ela é sedutora, atraente, a gente se perde naqueles olhos. Sua capacidade de atração sexual é irresistivelmente intensa. Eu queria conhecê-la, pensamentos, idéias por trás da máscara de confiança, beleza deboche. “Eu mudei”, ela me disse, “ você teria gostado de mim há três anos”. Ficamos sentadas na varanda durante horas, conversando, olhando para o vazio. Aí a atração cresceu, concentrou-se. Sua proximidade era elétrica em si. “Não vê que eu quero beijá-la?”, disse. E beijou-me avidamente, de olhos fechados, a mão quente a me queimar a barriga. “Eu queria odiar você”, falei. “Por que veio”? Eu desejava sua companhia. W. e C. queriam beber, eu também não estava afim disso.
Passava das onze; fui até a porta com ela e saí na noite fria de julho. “Venha cá”, ela me disse, “ preciso falar uma coisa bem baixinho: gosto de você, mas não muito. Não quero gostar muito de ninguém”. Aí levei um choque e revidei: “Eu gosto muito das pessoas, ou as detesto. Tenho de ir até o fundo, mergulhar nas pessoas, conhecê-las de verdade”. Ela foi clara: “Ninguém me conhece”. Aí acabou, ponto final. “Até nunca mais, então”, falei. Ela olhou para mim com dureza, com um sorriso no canto de boca. “Você tem sorte garota. Nem sabe a sorte que tem”. Eu chorava baixinho, sentia o rosto contraído. “Chega”! As palavras saíram como golpes de faca, depois suaves. “Viva a vida pra valer”, falei. E ela foi embora andando pelo caminho com seu jeito despreocupado, elegante. E eu fiquei ali onde me deixara, trêmula de amor e desejo, soluçando no escuro. Naquela noite foi duro dormir.

Wednesday, May 27, 2009

As coisas negras não ditas ocupam o coração deste texto.


Amo as pessoas. Todas elas. Amo-as. Creio como um colecionador de selos ama sua coleção. Cada história. Cada incidente. Cada fragmento de conversa. Meu amor é impessoal. É inteiramente subjetivo. Gostaria de ser qualquer um. Moribundo. Aleijado. Puta. E depois retornar para escrever sobre meus pensamentos, minhas emoções enquanto fui àquela pessoa. Mas não sou onisciente. Tenho de viver a minha própria vida. Ela é a única que terei. O presente é para sempre. O eterno está sempre mudando, fluindo, se dissolvendo. Este segundo é vida, e quando passa, morre. Mas você não pode recomeçar a cada novo segundo. Tem de julgar a partir do que já está morto. Como areia movediça, invencível desde o início. Uma história, uma imagem, pode reviver algo da sensação, mas não o bastante, não o bastante. Nada é real, exceto o presente, e mesmo assim já sinto o peso dos séculos a me esmagar. Uma moça, há cem anos, viveu como vivo. E ela está morta. Sou o presente, mas sei que também passarei. O momento culminante, o relâmpago fulgurante, chega e some. E eu não quero morrer.

Se o eterno não tivesse fixado suas leis contra o suicídio! O mundo é estéril. Vazio. Tedioso. Nada é firme e sólido. Erva daninha a espalhar o obsceno ato de existir. O homem retorna ao nada. Entre dois presságios de luz – o nascimento e a morte – a vida se mostra um doloroso adeus. Quero que minha alucinação seja algo de gigantesco. Quero que ela borde a minha loucura. O mais cáustico dos venenos é a lucidez.

Sou você


Eu poderia escrever sobre você. Poderia escrever sobre tua “ironia fina”, sobre tua dor. Tua vontade de mudar o mundo. Tua descrença. Tua desordem. Teu caos. Mas eu também sou você. Retroalimento-me de você. Sou você na tua maneira de sorrir. Sou você quando te observo calado. Sou você quando sinto tuas dores. Quando respiro teus traumas. Sou incondicionalmente você. Somos o mesmo lado da moeda. Somos o acaso em busca de respostas. Nosso grande livro está com as páginas trocadas. Precisamos ordená-las uma a uma?
Sou você quando sinto teu braço roçando no meu. Um leve deslizar de mãos. Teu olhar atento. Sou você na maneira curiosa como olha o outro. Sou você que também detesta o senso comum. Sou você que empalidece de dor quando ver homens nus nas calçadas. Sou você que também rejeita o conhecimento elitizado. Sou você que ver entre o mundo vira-lata e o mundo poodle uma dicotomia absurda. Sou você ao debruçar teus lindos olhos sobre a podridão do mundo. Sou você que não quer ficar calado. Que quer se expor. Sou você que se deita no travesseiro e sente o peso dos séculos te esmagarem as entranhas. Sou você que sofre. Que deseja.
Somos o abismo fundamental.
O vazio das horas.
O luto do mundo.

Friday, March 20, 2009

Previsões de um encontro irremediável





J. – Oi!
G. – Oi!
J. – Tudo bem?
G. – Tudo. E aí? Como foi a viagem?
J. – Um pouco cansativa. Muito tempo de vôo. (na falta do que dizer e exalando timidez por todos os poros do meu corpo, eu largo esta merda. Desde quando um vôo Salvador-Curitiba é cansativo?)
G. – E aí? Animada para o réveillon?
J. – Sim! Muito! É a primeira vez que venho a Florianópolis. Passar o réveillon na praia, um sonho!
A conversa tem pausas. A timidez lacra minha voz. Eu não consigo dizer nada. Tudo o que penso parece estúpido.

Seguimos direto para o albergue.

J. – É. Bonito lugar! E perto da praia. Eu adoro praia!

(Mentira. Eu detesto praia. Moro em frente à praia e não freqüento praia. O sol é desestimulante. Aquela confluência de corpos chamuscados por um vermelho-paixão. Exalando sensualidade. Fora isso eu estou branca feito uma estátua de mármore. Nunca gostei de “pegar” um bronze. Aliás, nunca fiquei bronzeada. No máximo fico vermelha. Vermelho-camarão. Conhece?)

G. – Eu acho que tu vais gostar dos meus amigos. Tem a C. a Ge.
J. – Sim. Claro. Conheço todos por Orkut. Simpatizei-me muito com a Ge.
G. – E a C?
J. – Ela toca violão! Eu sempre quis tocar um instrumento. Mas não levo jeito. Você me disse que ela tem a capacidade de reunir a galera. Fazer com que todos fiquem mais entrosados.
G. – É! A C. é uma irmã p. mim.
J. – Sim. Eu sei. Você me disse.

(Eu não tenho nada contra a C. Sério! Mas pessoas extrovertidas demais me assustam. Sim. Eu nem conheço a garota. E sempre me surpreendo com as pessoas. Mas eu sou ciumenta. Meu horóscopo chinês é o macaco-martelo. Ou macaco outra coisa? Ouvi isso dia destes de um astrólogo guru hippie/ avarento que certa vez levei para São Paulo e que me deu o maior calote)

(Tenho vontade de vomitar por meio de verborragias toda a ansiedade que senti durante estes dias. O medo. Expor todas as minhas carências. Dizer que me masturbava pensando nela. Tenho vontade de comê-la no exato momento em que nos encontrarmos)

J. – Eu acho que vou gostar de Florianópolis. Conheço Porto Alegre e Curitiba. Mas esta é a primeira vez que venho a Floripa.
G. – Sim. Tu vais gostar sim! É um lugar lindo. Já te disse isso pelo MSN.

J. – É. Tínhamos longas conversas pelo MSN.

(Internet. O sonho de consumo sexual-afetivo concretizado através de corpos-palavras. Como eu a amei durante todo este tempo.)

J. – Você é ainda mais bonita pessoalmente que pela web cam.

(Neste momento meu rosto fica rubro e eu dou um meio sorriso sem graça. Sorriso de gente tímida.)

G. – E o filme. Tu trouxeste?

J. – O diretor. Ele não me deixou trazer o filme porque tem a intenção de inscrevê-lo em alguns festivais. Não quer que o filme seja divulgado antes disso. Uma pena! Queria tanto te mostrar.

G. – Poxa! Uma pena mesmo!

(Encontro os amigos dela! A minha intuição diz que eu vou gostar mais da Ge.
Talvez porque ela tenha um instinto maternal em relação à G. A Ge se preocupa com a G. Eu gosto de amigos que se preocupam. Não que os outros não se preocupem. Mas não os conheço. Pelo menos a G. nunca me falou muito deles!)

A conversa flui!

Alguém: Quer dizer que tu és baiana hein?

J. – É. Sou.

Alguém: Mas tu não tens sotaque.

J. – Pois é. Sabe-se lá por que!

(Provavelmente alguém deve pensar que eu tenho vergonha do sotaque dos baianos. Talvez seja isso. Mas o fato é que eu gosto de línguas desde criança Sou muito “membrana plasmática”. Absorvo sotaques e atmosferas e hábitos com muita facilidade. Não sou nada barrista! Tenho que admitir! Mas o que é que nós baianos estamos vendendo p. o resto do Brasil? Música de baixa qualidade “música-pagode-baixaria”. Tudo misturado. No fundo com o mesmo refrão: Eu “dou” e tu me “dá” também. É. Infelizmente a era tropicália e bossa - João Gilberto é coisa do passado. E agora o Caetano tentando cantar Nirvana. Peloamordedeus!)

Alguém: Tu trabalhas com cinema?

J. –Fiz um filme apenas. Não trabalho com cinema.


Alguém: E do que se trata o filme?

(Esta é a pergunta mais difícil. Mas vamos lá!

(Sóbria eu diria que se trata de um triângulo amoroso que envolve três personagens. Um hetero que se apaixona por um gay e que mantém uma relação destrutiva com uma mulher. Bêbada eu diria: Eu entrei no filme quando o roteiro já estava pronto. O filme se resumia a uma história de amor entre dois homens que terminava em tragédia com a morte de um deles. Durante a produção do filme fui dando alguns palpites ao diretor. Acabei assumindo a função “voz off”. Transformei o personagem assassinado no narrador em off. Tentei ao máximo não planificá-lo. Problematizá-lo e fazer com que ele transitasse com total liberdade de pensamento por entre todos os ambientes. Inclusive invadindo o pensamento dos outros dois personagens da trama.)


Alguém: Parece interessante. Pena que tu não trouxeste!

J. - Pois é. Cinema tem destas coisas!

(Cinema é na verdade uma puta feira de vaidades. Cada um querendo salvaguardar seu ego. Quanto mais inflado o ego de uma pessoa que trabalha com cinema, mais ele se sente um novo Lukas Moodysoon.)

G. - (Linda. Observando a conversa)
Tu pensas em passar quantos dias aqui?
J. – Não sei. Estou vendo aí! (típica resposta de quem já está morrendo de amores e que gostaria de passar a eternidade ao lado dela)

Preparativos para o réveillon

Por etapas:
1) Escolher a roupa. Nada que marque minha cintura e revele as gordurentas que eu vou tentar esconder. Claro!
2) Maquiagem: Etapa mais difícil! Delineador? Nem pensar! Há dois meses R. passa o delineador em mim e eu não aprendo a usar aquilo! Afinal, delineador é tinta! É difícil. E eu tenho uma péssima habilidade motora.
3) Aguardar G. no albergue? Será que ela vai me buscar no albergue ou eu vou ter que ir até a praia ao encontro deles?
4) Caso isso aconteça: Ligar antecipadamente p. G. marcando um local de encontro. Ou. Construir um mapa que me faça chegar exatamente ao local onde eles se encontram.

(Aqui nós temos o hábito de ensinar as coisas de forma aleatória. Sem muitas explicações. Lá eles ensinam geralmente usando as palavras: Tu segue reto! Ou. Anda mais duas quadras! Minha cabeça fica zonza com estas explicações. Vai ser o jeito perguntar a no mínimo umas dez pessoas. Minha memória recente não é das melhores.)

Réveillon:

Sóbria:

Vou ficar calada que nem um túmulo e quando as pessoas perguntarem por que eu sou assim, tão calada, eu respondo: Gosto de observar. Este é meu jeito.

Bêbada: Vou tentar interagir com as pessoas e tentar ficar ao máximo perto da G. Vou tentar seduzi-la sem fazer cara de cachorro pidão! Isso não funciona! Vou ser gentil. Sem exageros.

Muito bêbada:
Vou começar a lembrar dos meninos e procurar um cartão p. ligar p. eles desejando feliz ano novo e dizer que estou morrendo de saudades.

Ai! Como eu to ansiosa!
Não vejo à hora de embarcar de vez p. Floripa.
E este rivotril que não faz efeito!
Merda!
Mas eu te amo G.!

A separação também faz parte de uma história de amor?




Meu coração pesava dentro de mim. Durante dias fiquei prostrada numa cama à sua espera, com a íntima certeza de que ela iria voltar, mas tudo o que eu via pela janela era o carro-preto da mulher de trinta. A mulher de trinta com cara de quarenta. A mulher de trinta com cara de quarenta e a menininha de vinte e cinco estavam juntas. Eu não conseguia acreditar nisso. Vedei meus olhos e comecei a acreditar apenas na minha fantasia. A fantasia. O condão de ouro. O “arco-íris” urbano que eu havia criado, com cores que em nada se assemelhavam ao escuro-real daquele quarto pequeno, me dizia que o universo era amplo, e no meu universo, ela era a minha noiva fantasma.

Quando o real se mostra opressivo, tal qual o beijo de um devasso, você aciona seu mecanismo de autodefesa criando uma sub-realidade, e passa a acreditar nela.

Eu e a angústia. Dormíamos abraçadas, à espera da noiva-fantasma.
Um, dois, três dias....

O tédio é o sentimento mais moderno que existe.
Finalmente a noiva fantasma aparece.

Noiva fantasma- Eu acho que a gente precisa conversar.

Ela tinha me abandonado por três dias e ainda se mostrava disposta a uma conversa. Tinha chegado com um perfume diferente. Os cabelos levemente molhados. O carro preto com a mulher de trinta com cara de quarenta estava na casa ao lado. Parado. No rosto um leve sorriso de sarcasmo.

J. - Olha, G, você não aparece em casa. Eu estou preocupada. Não quero te causar nenhum incômodo. Eu estou indo embora com os meninos, vamos para um albergue.

Noiva fantasma- Espera. Espera! Nós precisamos conversar.

J. - Você ficou com outra pessoa no réveillon. Certo?

Noiva fantasma- Sim!

J. - É. Eu percebi. Por isso que eu fui embora. Não precisava ficar ali para presenciar aquilo.
Noiva fantasma- É. Eu sei!

Noiva fantasma- Eu sou muito má quando eu não gosto.

Neste momento meu rosto assumiu uma expressão de dor tão profunda que eu não consegui vislumbrar nada além do imenso vazio que eu sentia. A minha visão se voltou para dentro e meu coração se transformou em uma víscera morta que palpitava aleatoriamente, em descompasso. Eu conseguia sentir o som do meu coração, era como se ele tivesse ganhado vida própria. O corpo palavra das longas conversas pela web tinha se transformado em um corpo-víscera mórbida. Eu era só coração.

Mas existiram as conversas no posto de gasolina próximo a casa dela. O humanismo. A dor ao ver o mendigo na calçada. O desejo momentâneo em estar comigo. O sorriso franco. O olhar de vidro. Tudo se misturou e explodiu dentro de mim. Eu era ela e era tudo o que ela sentia. Era o que ela sentia e o que eu sentia. Mas eu senti. Ela? Será que ela sentiu também?

J – A coisa não deu certo, claro. G ficou constrangida. J, decepcionada.

Noiva fantasma- Me doeu muito te ver naquele estado durante o réveillon, ver que você não conseguia interagir com as pessoas e não conseguir te abraçar.

J - Sofrendo bastante, vivendo, sangrando, e amando. O mito do artista sofrido parecia calar fundo no meu coração. Eu estava perdida!

Há pessoas que nascem e morrem sem nunca ter sentido espasmos de angústia.
Há pessoas que passam pela vida sem nunca ter chorado ou sentido. Elas morrem ou perdem o visgo muito cedo.
Quantas conversas. Quantas palavras não ditas. Quanto sentimento dilacerado, perdido nos trilhos de uma dor sem fim.

Uma nuvem preta me acompanhava. Uma nuvem de melancolia, aonde quer que eu fosse.
Acho que vou morrer amando.

A separação também faz parte de uma história de amor!




Era como se a nossa história não houvesse sido escrita.
“Entre a palavra e o ato existe a sombra”.

Eu estava “andando sobre pregos”. Fiel apenas a minha dor, presa em seu quarto, presa às suas coisas. Por três dias fiquei ali, a mesma roupa, o mesmo “olhar ferido”. Eu estava atravessada por uma nuvem de lágrimas.

Um simples toque abalaria toda a minha frágil construção. Como se soerguer depois de ter sido machucada até a exaustão?

O coração pesa quando se está sofrendo.

Em segundos tudo estava desfeito. Nada do que tínhamos planejado se tornou real.
Na minha cabeça existia apenas a certeza de um encontro que ainda estava por vir. Eu negava toda e qualquer possibilidade de aceitação do real. O real doía em proporções inimagináveis.

Nos dedos tinha apenas um esmalte preto desbotado. Andava pelas ruas como um cão faminto e desgraçado. Um cão contaminado por uma doença que afligia todos os sentidos. Eu estava paralisada. A dor do desencontro me paralisou. A dor da traição me despertou a pior de todas as sensações. A sensação de que só a morte calaria profundo minha tristeza.

O olhar dela era prego crivado em minha mente. Um olhar que me atraía como um imã para a confusão. Um olhar que dizia verdades que eu jamais ouviria.

O que ela falava não me interessava. Interessava-me seu olhar, apenas seu olhar, um portal de verdades que dissolviam a dor que eu sentia. Verdades, ou mentiras brancas?

Eu a esperei. Por três dias perdi todo e qualquer resquício de amor próprio. Iludi-me como uma idiota, uma retardada com idade emocional de 6 anos. Enquanto a “roda da vida” girava, enquanto o mundo girava, eu estava em seu quarto. A minha roda estava parada. Enquanto as pessoas transitavam pelas calçadas e pela areia das praias eu me refugiava em um quarto escuro, em uma roda que não se movia. Eu estava presa a minha dor. Eu e a angústia, unidas como irmãs siamesas.

Pateta. Palhaça. Em busca de um verdadeiro amor.

O olhar era o único componente vivo do corpo dela. O seu olhar era o corpo vivo que incansavelmente repetia: O amor mata! O amor mata!
E tudo o que eu buscava era a leveza de um sorriso franco!


Meus pensamentos estavam embaralhados, um cartel de cartas confusas a pontuar minha dor viva. A felicidade é rara quando se está sofrendo!

Por quê se manter na roda, a roda que gira, quando tudo o que você precisa é um contato tátil com alguém que ama?

Por três dias fiquei em sua cama. Deitada, objeto imóvel. Fiquei em seu quarto, sentindo sua presença, sua presença invisível, remoendo a certeza de um encontro que não se realizou.
Completamente cega. O mito do amor romântico calou profundo em mim. Cega sou um cão faminto, bicho solto que anda pelas ruas com um olhar ferido.

" E de repente sua boca procurou a minha, intensa, veemente, a língua penetrando por entre meus dentes, os braços feito ferro a me prender"



Esta noite vi G: D e eu abríamos caminho na enxurrada humana para sair do cinema, ela ia pelo outro lado de jaqueta preta. Mal a reconheci, maquiada, de olhos abatidos. Mas bela. “Andei procurando você por toda a parte”, falei, “G, telefone, escreva para mim”. Ela sorriu quase como a G. que eu conhecera, antes de sumir. Sabia que jamais teria uma amante assim como ela. Então saí de vestido branco, casaco branco, e me odiei pela hipocrisia. Adoro G. Tive outras amantes, eu sei. Algumas engraçadas. Diversão histérica. G. sou eu, o que eu seria se tivesse nascido numa família gaúcha de Novo Hamburgo. Significa mais para mim do que todas as moças graciosas e artificiais que posso conhecer. Ela é rude, dúbia. Talvez seja um dos meus egos. Talvez eu precise de alguém que jamais se torne minha rival.

Postagem sem título

Ela estava em meu quarto. Minha mãe estava em meu quarto. Ela não tinha idéia do que tinha acontecido comigo. Mas estava ali. Tagarelando sem cessar. Não sabia que eu tinha chorado “sem” lágrimas antes de dormir. Não sabia que o que restava era uma cama de ferro. Dura e áspera. Não tinha idéia de como eu estava me sentindo. Não conseguia ver que os médicos tinham feito minhas lágrimas secarem.

--- Você está magra! Quer dizer, não engordou muito!

Ahhhhhh! A reabilitação tinha me deixado gorda. Eu estava imensa. Como não ver isso?

Ansiolíticos engordam! Como ela era estúpida em achar que eu não tinha consciência disso. Meses em uma clínica tomando doses cavalares de ansiolíticos. Eu estava imensa! Uma vaca gorda que não conseguia enxergar a própria vagina. Mas minha mãe estava ali. Escondendo tudo. Escondendo meus traumas. Escondendo seus traumas. Tentando esquecer que eu tinha mentido em sua cara. Que eu tinha roubado seu dinheiro inúmeras vezes. Tentando esquecer os meus porres homéricos. Os cheques voadores. Os telefonemas anônimos. As namoradas anônimas. Os telefonemas das namoradas que eu tinha que manter no anonimato.

Eu era uma estranha para ela. Para todos eles. Eles e seu mundinho de julgamentos. Sempre desconfiados. Sempre paranóicos.

Aquela diversão histérica me incomodava. Eu não estava feliz em voltar para casa. Eu queria me manter invisível. Mas todos vinham me cumprimentar por estar “começando de novo”.

Quantas vezes terei que “começar de novo”?

---- Mãe, onde é a parte da mesa onde ficam os perdedores?


Putz! Eu não queria “recomeçar”! Não estava disposta a ter uma nova chance. Não queria ser parabenizada por um recomeço que eu não conseguia enxergar. Meses em um manicômio. Meses em uma cela cheia de lunáticos e eu tinha que demonstrar um equilíbrio instantâneo. Não! Eu continuava desequilibrada. E não queria forçar um aparente equilíbrio.

Meu mundo é uma ostra.

---- Okay. Vocês venceram! Vou tatuar “Madre Tereza de Calcutá” na testa para vocês! Satisfeitos?

---- Que mesa linda! Que jantar lindo! Vamos todos sorrir ao posar para as fotos do natal, okay? Precisamos destas recordações. Colocá-las em um álbum lindamente ornamentado.

Uma moça, há cem anos, viveu como vivo. E ela está morta. Sou o presente, mas sei que também passarei.

Sim. Eu não posso considerar a minha vida com curiosidade subjetiva o tempo inteiro. Tenho de viver a minha vida. Ela é a única que terei. Mas como viver a minha vida neste baile de máscaras. Neste “barco de luxo” naufragado?

----- Ah! Vocês não têm idéia de como era solitário viver naquela cela enquanto todos voltavam para o seu mundinho ordinário!

----- Você acha que o seu sofrimento é a coisa mais importante do mundo! Ah! Como você evoluiu no seu sofrimento!

----- Ahhhhhhh! Quem disse que eu penso desta forma! Ahhhh! Não! Eu não evoluí no meu sofrimento. Continuo amando. Sofrendo. Sangrando.

----- Eu quero sangrar até secar. Entendeu? E não estou pedindo para serem “leais” ao meu sofrimento. Não sofro por modismo. Sofro porque não saberia viver de outra forma. Algumas pessoas nascem com esta insígnia. É letal. Eu sei. É genético. Não sei. Sei que está em mim. Esta dor maldita está em mim. Esta angústia fedida está em mim e eu simplesmente não sei como me livrar dela.

----- Você nunca está feliz, mãe. Ao menos que eu esteja em algum tipo de situação desesperadora. Você não sabe o que fazer comigo ao menos que eu esteja em crise.

----- As pessoas te alertaram mãe. Eu era uma drogada. Uma louca viciada em drogas. Eu era uma chapada que vivia fora da realidade. Será que você não notava que os frascos de perfume que eu borrifava eram para esconder o cheiro da maconha?

----- Mãe, nós somos crucificados pelas próprias limitações. Nossas escolhas cegas não podem ser mudadas. Tornam-se irrevogáveis. Você teve suas chances. Não soube aproveitá-las. Chafurdada no “pecado original”! Mãe, eu perdi toda a alegria engaiolada neste quarto. Neste quarto minha dor crônica de viver se torna mais suave. Neste quarto eu sou meio-resolvida. Meio-desesperada. Lá fora os pensamentos me rondam como demônios. Cada pensamento é um inferno. Mãe, eu só quero voltar para casa. Eu só quero retornar ao útero. Eu só quero ver o mundo bater uma porta atrás da outra na minha cara e me manter anestesiada.

----- Eu vou ligar para sua médica. Ela precisa saber o que está acontecendo.

----- Todos na casa estão me vendo como se eu fosse uma visitante sociopata.
O que vocês querem que eu faça? Ponha fogo na casa?

----- Adoraria quebrar sua empáfia!

----- Who I have to be now! É verdade. Eu fui um pesadelo. Você foi uma santa. Mas desculpa. Mesmo assim eu não estou satisfeita em estar aqui
com vocês.

Tuesday, July 15, 2008

Postagem sem título




Numa sala imersa na escuridão, repentinamente iluminada por um facho de luz, Sarah, entre os dedos um cigarro de filtro vermelho, dominada por uma respiração abafada, silêncios prolongados e uma voz reticente, desvenda sua tensiva poesia.

No centro da sala me comporto como uma estátua imóvel, que, no entanto fala, respira e contempla atônita, ao som das notas frias de Ian Curtis, aquelas palavras vindas do nada, que se propagam até retornar ao vazio, numa pluralidade de sentidos que me inflama a alma.

Enigmática, Sarah diz estar escrevendo uma peça intitulada: 04h48 psicose, sobre uma depressão psicótica e o que acontece ao espírito de uma pessoa quando desaparecem completamente as barreiras distinguindo a realidade das diversas formas de imaginação. Tão bem que você não faz mais diferença entre sua vida sonhada e sua vida acordada.

Minha mente é polarizada por um misticismo caótico. Um universo de autênticos devaneios, com santos modelados à argila, dançando como deuses, envoltos em uma atmosfera sombria, surreal, onde uma penumbra deslumbrante e irrepreensível completa o ambiente.

A imagem é desfeita.

Kane começa a divagar sobre a peça, e prontamente sou acometida por um nó na garganta. Verdadeiros cataclismos internos inundam minha mente. Preciso de algo que abrande meus sentidos, estou sufocando. Ela me oferece uma dose de bebida. Um único gole, a bebida queima o estômago, a boca subitamente ganha um gosto amargo, e os pensamentos não acompanham as notas de Ian Curtis. Agora meus ouvidos estão totalmente voltados para Sarah, suas frases soltas, sua lucidez distorcida.

Às 04h48 eu não falarei mais (...). Às 04h48, happy hour. Quando a obscuridade faz sua visita. Quente obscuridade que banha meus olhos. (...) Às 04h48, quando a desesperança fizer sua visita, eu me enforcarei ao som do sopro do meu amante. Anuncia secamente, através de frases soltas, mescladas a versos soltos, diálogos e ritmos.

Um silêncio perturbador permeia o ambiente e eu não consigo vislumbrar nada através dos meus olhos, apenas uma latente escuridão.

Irremovível como uma pintura no centro da sala, acendo um cigarro e uma nova dose de bebida entorpece minha imaginação.

Um breve hiato criativo. Seus olhos parecem repousar sobre o vazio, revelam temor e uma angústia que me faz doer os ossos.

Durante toda a noite Sarah parece oscilar; morta viva, morta viva. Recosto meu rosto pálido sobre os lençóis que envolvem a poltrona. Eles se mostram opressivos, tal qual o beijo de um devasso.
O meu corpo em brasas. O conhaque parece fazer efeito.

“Morrer é uma arte, como tudo mais. Nisso sou excepcional”. Anuncia Sylvia Plath. Sinto um soco no estômago.

Eu quero morrer, rapidamente, mergulhada em minha própria angústia, em meu próprio desespero.

Reticente, quase monossilábica, Sarah ratifica não ter desejo nenhum de morte. Afinal, nenhum suicida nunca teve.

“Escrevo para os mortos, aqueles que não são nascidos”.

Ardo e me viro. Cinzas. Derreto-me em um grito.

Monday, June 30, 2008

O sangue é a linguagem do amor




Seu desejo era o silêncio. O silêncio intercalado entre o mistério e o vazio.

Durante horas permaneceu calada, dominada por um êxtase velado e pelos liames de uma profunda ligação amorosa, onde omitia o concreto, e sublinhava as entrelinhas do sublime.

A redoma de silêncio é despedaçada.

O lustre vermelho e a máquina de escrever sobre a escrivaninha do quarto imprimiam luz e sonoridade ao ambiente cinzento, onde sua face pálida assumia expressões fleumáticas.
Estilhaços de vidro mesclam-se as palavras agridoces que brotam da máquina.

O desejo inviolável oscila entre o real e o imaginário.

Manhã de sábado.

Não conseguia manter um vínculo real com as ruas, onde corpos chamuscados por um prazer descartável percorriam aflitos pequenos espaços nas areias das praias, onde todos pareciam à mercê do vermelho-paixão, da troca de fluídos, da satisfação primária dos desejos carnais. Ela estava sozinha, perdida entre pontes do sofrer sufocado, e reticências da volúpia impetrante.

A presença do Outro era vital, atormentava sua libido, incorporava vida a via crucis do seu corpo tímido, inoculando doses de veneno prostituído às escrituras íntimas do seu corpo em chamas.

O Outro aparece sob as vestes de um “Dom Ruan de saias”, provocando uma visível distorção de gestos, e disritmia de sensações, desfazendo sua expressão fleumática, reacendendo sua vontade de interseção carnal
Um beijo no espelho. A simbiose entre as duas mulheres unia identidades e insanidades.

Debruçada sobre a janela, contempla uma pena que suavemente desliza entre as folhas secas das árvores. Seu corpo não mais lhe pertencia, era propriedade exclusiva do Outro. Seus pensamentos foram suprimidos pelo desejo de exceder os limites da experiência possível.

Um cigarro aceso e um olhar traiçoeiro. Ela se esquiva sobre o leito, e o Outro mostra indícios de que irá desenhá-la.

Uma folha em branco, alguns rabiscos. O desenho logo é descartado, e Ele beija seu rosto subtraindo sua alma através de movimentos circulares, onde o êxtase atinge seu ponto nevrálgico quando “perfura” sua boca.

Duelo de titãs. O sol desacelera a chegada da noite. Linhas quentes invadem a sala. Ela prefere eternizar o milagre da transcendência entorpecida pelo calor da noite.

No quarto, onde luzes apagadas e velas acesas abrasavam os corpos, dominados por um ritual pagão, intercaladas por uma volúpia gritante, ela pede ao Outro que perfure sua vagina com um objeto cortante.

Absorvida por um olhar distante, entrecruzado pela loucura intocável da alma, nas mãos um tubo metálico, suplica ao Outro que a faça gemer de prazer.

O sangue vermelho contrasta sua pele alva, escorrendo por entre as pernas.

Nascem rosas do seu útero.

Catatônico, o Outro observa em seu rosto uma inebriante sensação de alívio.

Chorando copiosamente, suplica para que faça o sangue estancar.

Sem nenhum traço de remorso, e indiferente à dor, ela enfatiza que o sangue é a linguagem do amor.

O quarto paraíso


A cidadezinha do pequeno vilarejo era dominada por casas com telhados angulares, onde burgueses tranqüilos contemplavam a paisagem campestre, realçada por árvores caudalosas, e cedros que imprimiam ao ambiente as digitais da melancolia e do desespero.

Marta, entre ruídos abafados de idéias e pensamentos secretos, atribuía uma forte tensão à sua própria vida, denunciada pela disritmia das suas ações e seus delírios recorrentes.

Sua íris azul revelava um notável destemor, tonificada por uma loucura camuflada, visível apenas em pequenos gestos, pois suas atitudes eram pautadas por uma frívola e articulada discrição.

Era dona de longos diários. Escrevia para se sentir viva, para se libertar do ócio e da solidão criativa, embora preferisse ser apenas aceita.

Seus textos eram fortes, suas idéias eram permeadas por uma mutação corrosiva, revelavam a precariedade da existência, denunciava o nomadismo da consciência, as agonias do ser, a vontade inquebrantável da desagregação, como se cada palavra escondesse a certeza secreta de um ritmo de feitiçaria, como se, de cada linha, retirasse uma gota de sangue negro.

Amordaçada em seu quarto, porém em uma liberdade de sentidos que lhe fascinava o espírito, inclinava o pensamento para um universo distante, que ela costumava chamar “o quarto paraíso”.

Santos de barro, a voz de Mário Lanza, um silêncio leve e cinzento, linhas luminosas secas e velozes.

Abria uma vala, Heloísa entrava.

O quarto paraíso parecia completo.

Mas precisava morrer para ter uma resposta. Precisava da morte para sentir a frescura morna da terra, e o cheiro das plantas. Precisava mergulhar na escuridão para apreciar a noite.

Voltou-se ao banco onde Heloísa, sentada, mergulhava os olhos sonolentos no chão. Ela jamais a desapontava. Juntas, pressentiam que precisavam arquitetar um plano ameaçador.

Subitamente os olhos castanhos de Heloísa pressentiram a morbidez de Marta. Atenta a cada palavra, riu alto com veemência, acenando com um sonoro sim para a expressão atormentada da amiga, que revelava uma vontade apressada, um desejo incontrolável.

Desaparecer, este era o plano.

Sunday, June 22, 2008

It is cold inside




A curvatura do rio era íngreme. Os meandros desaguavam em um leito soturno. Tudo era dor.

A pele era um reinado poliforme de figuras distorcidas, um réquiem, com notas frias e impalpáveis.

Existe uma cruz em sua vagina que a divide em dois pedaços, mutilados e amorfos. O corpo é insólito.

Os fotogramas da sua alma demonstram que Esther é um negativo de si mesmo. A negação da criação. Mergulhada em um abismo de dor indigna, infecta, diz um não proeminente à sua própria constituição física.

A superfície da víscera oca. Uma sinfonia de Mozart.

Quando a obscuridade quente banha seus olhos, a víscera oca se torna um paroxítono. Um crescendo de sons disformes, incompreensíveis.

A vida sonhada é melhor que a vida acordada.

Os ansiolíticos amortecem seu corpo, o tornam estático, com traços de sórdida mudez. Apenas sons onomatopéicos, surgidos do nada, oriundos do topo, em profusão contínua em direção ao poço.

Ter um corpo mutilado significa ter uma alma em uníssono vibrante, com cores fortes, imagens polifônico.

A mão de Nosferatu persegue Esther. Esta terceira mão são os fragmentos despedaçados de sangue morno. A angústia viva.

Angústia é o excesso de voz entupida.

Os ansiolíticos causam morte. Uma morte peremptória. Sucessivas mortes.

Seu calvário, seu palácio. O excesso, sua lucidez. O amor é seu desespero.

Esther e seus vômitos de desespero mudo

Os estilhaços de vidro, o confronto da sua imagem com o espelho a faz ter pesadelos.

A morbidez da transcendência.

A vontade inquebrantável da desagregação.

Existe um paraíso artificial que a petrifica. Uma vida sem nome, onde o amor é apenas uma miragem.

Cecília, uma imagem. Pele alva, fios de ouro. Esther é mergulhada numa liberdade de sentidos. Seu corpo ganha um prazer genuíno. Orgasmos múltiplos.

Esther dorme embalada pela imagem aurática de Cecília.

Cecília, um ser celeste. Uma bailarina que carrega santuários mitológicos na cabeça, flutuando por entre - lugares, olhando para os arranha-céus da cidade com a curiosidade de um ser que acabara de nascer.

Um beijo e um olhar no espelho. A simbiose entre as duas mulheres permitia uma confluência de sentidos. A intercalação. O olhar duplo. O olhar único.

Os passos lentos e poéticos de Cecília, sempre à meia luz, fazem da cidade um lugar cheio de vida quimérica.

Os jardins esquecidos, os esgotos fétidos se tornam palácios cheios de vida e sabedoria.

O olhar de Cecília, um ritmo de feitiçaria.

As letras no papel impresso começam a perder nitidez.

Os ansiolíticos invadem o cérebro de Esther.