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Tuesday, July 15, 2008

Postagem sem título




Numa sala imersa na escuridão, repentinamente iluminada por um facho de luz, Sarah, entre os dedos um cigarro de filtro vermelho, dominada por uma respiração abafada, silêncios prolongados e uma voz reticente, desvenda sua tensiva poesia.

No centro da sala me comporto como uma estátua imóvel, que, no entanto fala, respira e contempla atônita, ao som das notas frias de Ian Curtis, aquelas palavras vindas do nada, que se propagam até retornar ao vazio, numa pluralidade de sentidos que me inflama a alma.

Enigmática, Sarah diz estar escrevendo uma peça intitulada: 04h48 psicose, sobre uma depressão psicótica e o que acontece ao espírito de uma pessoa quando desaparecem completamente as barreiras distinguindo a realidade das diversas formas de imaginação. Tão bem que você não faz mais diferença entre sua vida sonhada e sua vida acordada.

Minha mente é polarizada por um misticismo caótico. Um universo de autênticos devaneios, com santos modelados à argila, dançando como deuses, envoltos em uma atmosfera sombria, surreal, onde uma penumbra deslumbrante e irrepreensível completa o ambiente.

A imagem é desfeita.

Kane começa a divagar sobre a peça, e prontamente sou acometida por um nó na garganta. Verdadeiros cataclismos internos inundam minha mente. Preciso de algo que abrande meus sentidos, estou sufocando. Ela me oferece uma dose de bebida. Um único gole, a bebida queima o estômago, a boca subitamente ganha um gosto amargo, e os pensamentos não acompanham as notas de Ian Curtis. Agora meus ouvidos estão totalmente voltados para Sarah, suas frases soltas, sua lucidez distorcida.

Às 04h48 eu não falarei mais (...). Às 04h48, happy hour. Quando a obscuridade faz sua visita. Quente obscuridade que banha meus olhos. (...) Às 04h48, quando a desesperança fizer sua visita, eu me enforcarei ao som do sopro do meu amante. Anuncia secamente, através de frases soltas, mescladas a versos soltos, diálogos e ritmos.

Um silêncio perturbador permeia o ambiente e eu não consigo vislumbrar nada através dos meus olhos, apenas uma latente escuridão.

Irremovível como uma pintura no centro da sala, acendo um cigarro e uma nova dose de bebida entorpece minha imaginação.

Um breve hiato criativo. Seus olhos parecem repousar sobre o vazio, revelam temor e uma angústia que me faz doer os ossos.

Durante toda a noite Sarah parece oscilar; morta viva, morta viva. Recosto meu rosto pálido sobre os lençóis que envolvem a poltrona. Eles se mostram opressivos, tal qual o beijo de um devasso.
O meu corpo em brasas. O conhaque parece fazer efeito.

“Morrer é uma arte, como tudo mais. Nisso sou excepcional”. Anuncia Sylvia Plath. Sinto um soco no estômago.

Eu quero morrer, rapidamente, mergulhada em minha própria angústia, em meu próprio desespero.

Reticente, quase monossilábica, Sarah ratifica não ter desejo nenhum de morte. Afinal, nenhum suicida nunca teve.

“Escrevo para os mortos, aqueles que não são nascidos”.

Ardo e me viro. Cinzas. Derreto-me em um grito.