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Sunday, June 22, 2008

It is cold inside




A curvatura do rio era íngreme. Os meandros desaguavam em um leito soturno. Tudo era dor.

A pele era um reinado poliforme de figuras distorcidas, um réquiem, com notas frias e impalpáveis.

Existe uma cruz em sua vagina que a divide em dois pedaços, mutilados e amorfos. O corpo é insólito.

Os fotogramas da sua alma demonstram que Esther é um negativo de si mesmo. A negação da criação. Mergulhada em um abismo de dor indigna, infecta, diz um não proeminente à sua própria constituição física.

A superfície da víscera oca. Uma sinfonia de Mozart.

Quando a obscuridade quente banha seus olhos, a víscera oca se torna um paroxítono. Um crescendo de sons disformes, incompreensíveis.

A vida sonhada é melhor que a vida acordada.

Os ansiolíticos amortecem seu corpo, o tornam estático, com traços de sórdida mudez. Apenas sons onomatopéicos, surgidos do nada, oriundos do topo, em profusão contínua em direção ao poço.

Ter um corpo mutilado significa ter uma alma em uníssono vibrante, com cores fortes, imagens polifônico.

A mão de Nosferatu persegue Esther. Esta terceira mão são os fragmentos despedaçados de sangue morno. A angústia viva.

Angústia é o excesso de voz entupida.

Os ansiolíticos causam morte. Uma morte peremptória. Sucessivas mortes.

Seu calvário, seu palácio. O excesso, sua lucidez. O amor é seu desespero.

Esther e seus vômitos de desespero mudo

Os estilhaços de vidro, o confronto da sua imagem com o espelho a faz ter pesadelos.

A morbidez da transcendência.

A vontade inquebrantável da desagregação.

Existe um paraíso artificial que a petrifica. Uma vida sem nome, onde o amor é apenas uma miragem.

Cecília, uma imagem. Pele alva, fios de ouro. Esther é mergulhada numa liberdade de sentidos. Seu corpo ganha um prazer genuíno. Orgasmos múltiplos.

Esther dorme embalada pela imagem aurática de Cecília.

Cecília, um ser celeste. Uma bailarina que carrega santuários mitológicos na cabeça, flutuando por entre - lugares, olhando para os arranha-céus da cidade com a curiosidade de um ser que acabara de nascer.

Um beijo e um olhar no espelho. A simbiose entre as duas mulheres permitia uma confluência de sentidos. A intercalação. O olhar duplo. O olhar único.

Os passos lentos e poéticos de Cecília, sempre à meia luz, fazem da cidade um lugar cheio de vida quimérica.

Os jardins esquecidos, os esgotos fétidos se tornam palácios cheios de vida e sabedoria.

O olhar de Cecília, um ritmo de feitiçaria.

As letras no papel impresso começam a perder nitidez.

Os ansiolíticos invadem o cérebro de Esther.

Overdose de vida



Dominada por uma palidez cadavérica, como se estivesse envolta em um grande capuz branco, Sylvia Plath se mostra refém do próprio desespero, mergulhada em seu esgoto de mágoas.

Amordaçada, sob pontes entre o sofrer e o pecado, denuncia viver entre o martírio e a morte.

Inglaterra, década de sessenta.

Londres é dominada por um inverno rigoroso.

Frêmitos.

Alguém parece chamar-lhe a porta. Atônita, enlaçada por um olhar sombrio e penetrante, dirige-se até o jardim. O jardim se mostra vago, incompleto e escurecido, dominado por várias roseiras e cedros que exalam um odor cinza, todos cobertos de neve.
O branco contrasta o negro. A lua, um grande capuz embranquecido, ilumina palidamente o cenário.

Sylvia finalmente abre a porta. Um jovem, dono de uma voz suave e aureolada por uma profunda tristeza, lança um olhar fixo para Sylvia. Seria capaz de lhe roubar os pensamentos.

Intrigada, Plath questiona a razão da sua visita, e convida o jovem para tomar um chá.

A noite pousa lentamente, inundando a terra de amargura.

Mergulhados em uma latente escuridão, Sylvia e o jovem, este observa uma coroa um pouco acima da cabeça da imagem da Virgem, com exatamente nove estrelas, sendo que uma delas estava apagada.

Ao som de Maria Callas, “Ah Bello a mi Ritorna”, horas ardentes, profundas e lentas, prevêem uma noite de volúpias.

A “chama” mescla-se a “neve branca”, um beijo ardente sela o inevitável, e os corpos se entrelaçam. Sylvia pousa sua cabeça, tão cheia de quimeras, no corpo quente do jovem, que retribui o gesto com beijos ardentes.

Caem folhas mortas sobre o jardim.

O cenário externo, totalmente angustiante, integralmente sombreado, e carregado de uma evasão melancólica, contrasta com o interior da casa, um ambiente onde a volúpia é impetrante.

“Tosca és um Buon Falco”, novamente Maria Callas, agora intercalada por breves versos, que o jovem sussurra nos ouvidos de Plath.
A melancolia assola a poeta, que atribui à noite de volúpias um desfecho memorável:

“Acredito que existe um lugar,
Onde as almas aflitas vagam,
Sob o peso da própria tristeza,
Esperando a hora certa de acertar,
De corrigir o que está errado,
Só então, podem reencontrar,
Aqueles que realmente amam,
Às vezes um corvo indica um caminho,
Por que às vezes, o “Amor é mais forte que a morte”.